Textos avaliam não só o domínio do inglês, mas também a maturidade,o pensamento crítico e o perfil pessoal do candidato
Para quem sonha em estudar em uma universidade norte-americana, o processo até a aprovação envolve muita preparação, análise de currículo do candidato, testes como o Scholastic Assessment Test (SAT) – uma espécie de Enem dos Estados Unidos – e as essays, redações obrigatórias em que o aspirante à vaga tenta convencer que ele está preparado e merece estudar na instituição de ensino pretendida.
A essay é um dos elementos mais importantes do processo seletivo. Segundo a conselheira de carreiras do Brazilian International School – BIS, de São Paulo/SP, Ana Cláudia Gomes, a redação permite ao estudante mostrar quem ele é, suas experiências, valores e o que o torna único. “O currículo acadêmico e os testes mostram em que nível de conhecimento o aluno está. Já a redação é a oportunidade para o candidato sair dos números e das estatísticas. No texto, os avaliadores buscam compreender a dimensão humana do aspirante a universitário, o que aquele estudante pode agregar à comunidade acadêmica, seja em termos de ideias, diversidade ou engajamento”, explica.
O que é e para que serve a essay?
A essay é uma redação dissertativa em inglês, que pode assumir diferentes formatos conforme a instituição. Sua função é apresentar o candidato de forma subjetiva, permitindo que os avaliadores compreendam sua trajetória, personalidade e capacidade de reflexão. Enquanto o histórico escolar evidencia o desempenho acadêmico, a essay demonstra autoconhecimento, coerência e propósito — aspectos muito valorizados pelas universidades americanas.
O peso pode variar conforme a faculdade, mas no geral, a essay pode corresponder a até 30% da pontuação do candidato, enquanto os testes e o currículo (notas e atividades realizadas durante o ensino básico) têm peso de 20 a 50%, respectivamente. De acordo com a especialista, muitas vezes é o texto pessoal e autêntico que diferencia dois estudantes com currículos semelhantes.
Tipos de essay
Há mais de um tipo de essay exigido nos processos seletivos. O mais comum é o Personal Statement, obrigatório e utilizado por centenas de universidades. No texto, o estudante escolhe e responde a uma pergunta aberta, que costuma girar em torno de temas pessoais, como desafios superados e momentos de aprendizado, ou experiências marcantes.
Exemplos comuns de perguntas incluem: “Conte sobre um desafio que transformou sua forma de ver o mundo”, “Descreva uma experiência que despertou sua curiosidade intelectual” ou “Relate um momento em que você questionou uma crença ou ideia”. Também são frequentes temas como o impacto de uma conquista pessoal, o aprendizado a partir de um erro ou a influência de alguém importante na trajetória do candidato.
Há universidades que pedem ainda as chamadas Supplemental Essays, textos complementares que variam em número e tema conforme cada instituição. Elas podem abordar perguntas como “Por que você quer estudar na nossa universidade?” ou “Como pretende contribuir para nossa comunidade acadêmica?”. Algumas instituições de ensino podem solicitar respostas curtas e criativas, em formato de parágrafo ou até mesmo listas, para avaliar originalidade e autenticidade.
Por isso, mais do que dominar a estrutura do texto, o segredo é encontrar uma narrativa autêntica e consistente, que dialogue com a trajetória e a candidatura apresentada nos testes e no currículo. “A essay ideal é aquela que só poderia ter sido escrita por aquela pessoa específica”, resume Ana Cláudia.
Estrutura e estilo do texto
Embora o formato seja livre, a essay geralmente segue uma estrutura que em alguns pontos se parece com a redação do Enem brasileiro, com introdução, desenvolvimento e conclusão. A diferença é que o aluno que busca uma vaga nos EUA tem bastante tempo para preparar sua essay, além de poder pesquisar, revisar e contar com orientações de professores e mentores antes de enviar a versão final – ao contrário da redação do Enem e de vestibulares brasileiros, que delimitam o tempo para realização e não permitem consultas a fontes externas.
O texto pode ter até 650 palavras, dependendo da faculdade pretendida, e é fundamental que tenha clareza, coesão e aspectos pessoais do candidato. Além do conteúdo, o domínio da língua inglesa também é avaliado. É fundamental demonstrar precisão gramatical e variedade de vocabulário, mas sem exageros. Textos excessivamente rebuscados podem parecer forçados e comprometer a naturalidade da narrativa.
Ana Cláudia explica que o estilo deve refletir a identidade do aluno, e não um modelo pronto. “Os avaliadores leem milhares de redações. Eles reconhecem imediatamente quando um texto soa artificial. O maior diferencial, ao meu ver, é ser sincero. Mesmo que a história pareça simples, se for verdadeira e bem escrita, ela se destaca.”
Dicas para uma essay perfeita
Para começar, o candidato deve refletir sobre experiências significativas e identificar o que aprendeu com elas. Boas essays costumam partir de histórias pessoais que revelam valores, escolhas e perspectivas.
Outras recomendações incluem:
- Atente-se ao propósito central: as redações (ou essays) são a única parte da candidatura onde o aluno pode se apresentar como uma pessoa, e não apenas como um conjunto de notas e pontuações. Elas avaliam caráter, maturidade, autenticidade e a capacidade de reflexão, e não apenas o conhecimento acadêmico.
- Entenda as diferenças entre as redações: a redação principal (Personal Statement), é mais abrangente e revela a voz e os valores do candidato; e as redações suplementares (Supplementals), são mais curtas e específicas, geralmente perguntando o porquê de o aluno querer estudar naquela universidade e a razão pela qual ele escolheu aquele curso.
- Foco na reflexão: o erro mais comum é usar a essay como um segundo currículo. As universidades querem saber o “porquê” de suas experiências e não apenas o “o quê” (o evento, a nota ou a atividade). A reflexão sobre o impacto, a lição aprendida e o crescimento pessoal é o que realmente conta.
- Originalidade: o comitê de admissão lê milhares de redações. O segredo é a autenticidade. O candidato deve contar uma história envolvente (storytelling) que só ele poderia contar, demonstrando como pensa e como reagiria a desafios, utilizando sua voz genuína.
- Habilidade essencial: além do conteúdo, as redações testam a capacidade de escrita clara, concisão e pensamento crítico do aluno, sendo um indicador de seu potencial sucesso em um ambiente universitário rigoroso.
- Alinhamento institucional: as supplementals são a chave para demonstrar interesse genuíno (o demonstrated interest). O aluno deve articular como suas paixões e objetivos se alinham especificamente com os programas, o campus e a missão da universidade em questão.
- Não deixe a Inteligência Artificial escrever: a redação precisa estar coerente com o nível de inglês do aluno, refletido na sua nota do teste de proficiência. O que pode ser o ponto forte e determinante para sua aceitação, pode se transformar no vilão que descaracteriza o aluno como plagiador ou desonesto. A redação que apresenta o candidato precisa ser coerente com toda a informação da aplicação, refletindo realmente a verdade e ser ‘a sua cara’.
Ana Cláudia destaca que muitos alunos se surpreendem ao descobrir o quanto aprendem sobre si mesmos durante o processo. “Escrever uma essay é, antes de tudo, um exercício de autoconhecimento. O estudante revisita suas conquistas, fracassos e motivações. É um texto que fala sobre o passado, mas também projeta o futuro”, conclui Ana Cláudia.
A especialista: Ana Cláudia Gomesé mestre em Comportamento Organizacional pela University of Nevada (EUA), Pós-graduada em Bilinguismo pela Faculdade Singularidades, bacharel em Língua Inglesa e Literatura e em Pedagogia, além de possuir certificações em tradução simultânea e aconselhamento educacional. É especialista em orientação acadêmica e aplicação para universidades internacionais, com sólida experiência como coordenadora pedagógica e docente em escolas bilíngues, tendo liderado projetos de formação docente, análise de dados educacionais e desenvolvimento curricular.








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